Fundo partidário distribuiu 371,9 milhões de reais às
legendas brasileiras em 2014. Só o PT ficou com 50 milhões de reais, 16% do
valor a que os partidos têm direito
A legislatura que se inicia no próximo domingo no Congresso Nacional será a mais fragmentada desde a redemocratização do Brasil,
em 1990, com seus 594 representantes eleitos por 28 partidos diferentes — seis
a mais que na eleição de 2010. Faltou espaço para quatro das 32 legendas
existentes atualmente no Brasil frequentarem o Parlamento, mas outras 42
alimentam a pretensão de fazê-lo daqui a quatro anos.
Existem 42 partidos políticos em formação no Brasil, segundo
os dados disponíveis no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre legendas com
registro em pelo menos um dos 27 tribunais regionais do país. Desses projetos,
o que causa mais expectativa atualmente no Congresso Nacional é a recriação do
Partido Liberal (PL), que, depois de ser extinto em 2006 para dar origem ao PR,
promete atrair de 20 a 30 parlamentares logo que ressurgir — o pedido de
registro ao TSE deve ser apresentado após o Carnaval. Mas, se já existem 32, e
nem todos conseguem eleger representantes para o parlamento, para que mais
partidos?
A resposta pode estar no bolso. Os partidos políticos
brasileiros dividiram 371,9 milhões de reais reunidos pelo Fundo Partidário em
2014. O fundo é composto por dinheiro público, previsto no orçamento da União
(313,5 milhões de reais), e por multas eleitorais (58,4 milhões de reais), que
foram tantas no ano passado que os partidos devem receber um "extra",
ainda não calculado, em abril deste ano.
Esses valores são divididos de acordo com o número de
deputados eleitos por cada partido, o que valeu ao PT, que
tem a maior bancada da Câmara, 59,7 milhões de reais (16% do total) em
2014. Sem representação parlamentar, o Partido da Causa Operária (PCO) entra na
disputa dos 5% do fundo a ser partilhado igualmente por todas as legendas e
ficou com a menor parte do bolo (0,16%). Mesmo assim, recebeu 610.097,61 reais.
Mas o dinheiro explica apenas uma parte do fenômeno de surgimento de novos
partidos no país.
Presidente do diretório nacional do PL, Cleovan Siqueira
conduz o processo de retorno da agremiação e disse ao El PAÍS que os mais
tradicionais partidos brasileiros viraram "capitanias hereditárias",
cujo comando passa de pai para filho, o que leva políticos insatisfeitos a
buscar espaço em novas legendas. Principalmente depois de uma alteração na lei,
em 2007, que passou a impedir que o parlamentar que troca de partido permaneça
no cargo, a não ser que esteja indo para um partido novo, ou para partidos em
fusão, que é o que pode ocorrer com o PL e o PSD.
Foi nessa conjuntura que nasceram, nos últimos quatro anos,
grupos como o próprio PSD (Partido Social Democrático), criado pelo hoje
ministro das Cidades, Gilberto Kassab, o Partido Republicano da Ordem Social
(Pros), o Partido Ecológico Nacional (PEN) e o Solidariedade (SD).
A criação de uma nova agremiação partidária também responde,
contudo, à vontade de representação de um grupo ao bandeiras específicas, como
mostram os nomes dos partidos que pleiteiam o registro nacional. No Tribunal
Regional Eleitoral (TRE) do Ceará, por exemplo, estão registradas agremiações
como o Partido da Mulher Brasileira (PMB), que já aguarda julgamento no TSE, e
o Partido dos Servidores Públicos do Brasil (PSPB).
Não existe uma bancada do servidor
público no Congresso Nacional, diz o presidente do PSPB, Nilson Domingues
Presidente do PSPB, Nilson Domingues prevê apresentar em
março ao TSE as 492.000 assinaturas necessárias para criar um partido no
Brasil. Segundo ele, o partido tem registro em 11 tribunais regionais e faltam
50.000 apoios para o pedido de registro nacional. "No Congresso Nacional,
nas câmaras municipais e nas assembleias só existem bancadas de ruralistas,
empresários.
Não há uma bancada de servidor público. Mas a máquina pública
é gerada pelos servidores", argumenta Domingues, que também promete
representar os trabalhadores da iniciativa privada com a nova legenda.
Em meio a causas e categorias, também surgem no Brasil
iniciativas como o partido Novo, que aguarda julgamento no TSE para surgir como
a primeira legenda de cunho econômico liberal do país, e o ainda em gestação
Avante, projeto inspirado no barulho causado pelo esquerdista Podemos na Espanha. Para o cientista
político Túlio Velho Barreto, pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco,
entretanto, essas propostas de cunho ideológico ainda não são representativas e
devem demorar anos antes de conseguir mudar alguma coisa no modo como se fazer
política no Brasil.
Marina Silva
Disputando a sigla PMB com o partido da mulher, o Partido
Militar Brasileiro também articula seus registros regionais, assim como o
"Pai do Brasil", sigla escolhida pelo Partido dos Pensionistas,
Aposentados e Idosos do Brasil. E ainda estão em formação grupos como o Partido
da Educação e Cidadania (PEC), o Partido Universal do Meio Ambiente (Puma), o
Igualdade, com registro de janeiro deste ano no TRE do Acre, e a Rede
Sustentabilidade, capitaneada pela ex-senadora Marina Silva, que, sem conseguir reunir assinaturas
suficientes para seu partido, acabou concorrendo à presidência da República no
ano passado pelo PSB, após a morte de Eduardo Campos.
O caso da Rede se tornou emblemático, porque foi durante a
tentativa de Marina de criar uma terceira via na política brasileira, em 2013,
que o Congresso Nacional aprovou, com a ajuda da base aliada do Governo Dilma
Rousseff, uma nova regra para inibir a criação de legendas.
Desde outubro daquele ano, o acesso dos novos partidos à
maior parte do Fundo Partidário e do tempo de propaganda de TV só será
concedido depois que eles elegerem seus primeiros parlamentares, ainda que um
deputado já eleito tenha optado por migrar para a nova sigla. Isso não parece o
bastante, contudo, para desencorajar nenhum dos 42 partidos em formação no
Brasil.